Mulher Vulgar

Um certo dia, andava eu pelo Instagram e vi a publicação de um texto "Carta à uma Mulher" por Rui Jorge de Oliveira. Logo que comecei a ler deu-me vontade de responder à carta, e assim o fiz. Espero que gostem.


... passou a valer mais à pena dares o som momentâneo dos teus gemidos aos que bem se podiam prender por toda uma vida ao agridoce som da tua linda voz mesclada á tua irrecusável inteligência ? gostava que me dissesses se deceção ou rasteira amorosa alguma justifica o facto de te tornares facilmente palpável, descartável e até "humilhavel". Gostava que me dissesses se te adianta ignorar o número dos que deslizam entre as tuas pernas quando para eles continuas sendo mais uma ... Gostava que me dissesses se também foste buscar esse espírito de ficha tripla na treta que são os direitos iguais, ou no caso, defeitos iguais, hoje eu gostava mesmo que me dissesses por que te portas como um clichê, um dado adquirido, quando segundo as tuas qualidades bem podias ser um desafio, um quebra-cabeças ou qualquer outra coisa menos o alimento diário do ego desses meninos mascarados de homens ... Hoje, eu gostava também que me dissesses se colocar no plural o que era suposto viver no singular te torna diferente, ou apenas igual ao atual e triste habitual, gostava que me dissesses se te sentes arrependida pelo que tens andado a fazer ou simplesmente preferes pensar que das "maracutaias" da tua mão esquerda, a direita não precisa saber, gostava que me dissesses se aprecias mesmo tanto assim essa bunda empinada, que nem vai durar para sempre, para viver expondo-a em históricos de whatsApp, eu gostava que me dissesses se achas mesmo que a tua melhor amiga sente inveja de ti por teres uma multidão quando ela "só" tem uma relação, com altos aqui, baixos ali, mas sempre no coração.

Enfim, hoje eu quero que penses nesse paleio todo, mas que acima de tudo não te esqueças de me dizer em que motivo descobriste que lucro existe em ser de muitos, quando ninguém é de você ...
-Beijos sem malícia (...)


" Resposta de uma mulher vulgar "


Olá moço, hoje, eu respondo à tua carta. Dispensei tuas apresentações, motivações e tal, sendo a inspiração visita, mato as tuas dúvidas e a gente aqui se "quita". 

Tantas vezes tentei imaginar, se o tecido que sobrepõe minha pele e mostra meu corpo,  também mostra o que realmente há dentro dele. Tentei imaginar se a maquiagem vistosa, consegue paliar o meu incomensurável sorriso de tristeza.

Sempre quis que o mundo me ouvisse gritar, mas o meu tom não foi ostentoso, limitou-se a alimentar os ouvidos de quem meu corpo cobiçavam; até meus olhos mais brilhavam, e mais do que a minha linda voz falavam.

Desde miúda meu padrasto ansiava por mim quando minha mãe não se encontrava. Eu contei, ainda me lembro como gritava, tanto chorei, e mesmo assim ignorada. Entreguei-me à prazeres da vida, o desgosto me venceu. Desconheço o amor. Acredito em falsas palavras, são vazias, são apenas palavras. Elas são o que são. "Te amo" no meu ouvido e eu mesma indico o sentido, para o caminho entre minhas pernas.

Sou diferente das outras mulheres da minha idade. Não simplifico as coisas. Me perco em meus próprios pensamentos, vítima de meus próprios actos. Vivida e inconsequente.

Não amo meu corpo, é defeituoso, é torto. Mas há quem goste mesmo assim. Minha bunda empenada tem seu charme, cai bem no meu vestido vermelho justo. Meus seios tiveram um custo, fizeram sobressair meu busto. Meu cabelo custou mais que meus livros, mas meus livros não me dão prazer.

Gostaria de ter um homem que cuidasse de mim e ansiasse por mim em casa como meu padrasto. Mas talvez eu tenha medo , homem para mim é nefasto. 
Enfim, hoje pensei sobre aquele paleio todo, e sobretudo em te dizer que satisfaço-me ao satisfazer.

Outros. Aprovar tudo costuma ser ignorância; reprovar tudo, malícia.